sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Vaga, no Azul Amplo Solta





Vaga, no azul amplo solta,


Vai uma nuvem errando.


O meu passado não volta.


Não é o que estou chorando.






O que choro é diferente.


Entra mais na alma da alma.


Mas como, no céu sem gente,


A nuvem flutua calma.






E isto lembra uma tristeza


E a lembrança é que entristece,


Dou à saudade a riqueza


De emoção que a hora tece.






Mas, em verdade, o que chora


Na minha amarga ansiedade


Mais alto que a nuvem mora,


Está para além da saudade.






Não sei o que é nem consinto


À alma que o saiba bem.


Visto da dor com que minto


Dor que a minha alma tem.




Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"






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